Carta aos evangélicos
A primeira edição desta cartilha foi muito comentada por sites e blogs evangélicos. Pensando nisso, decidimos escrever essa carta para fazer alguns esclarecimentos importantes.
Propomos a quem ler esse texto, que o leia de peito aberto. Não esperamos que concordem com ele, mas que entendam o nosso lado da questão.
Não queremos amordaçar ninguém. Apenas não aceitamos que nos coloquem como pessoas menos dignas, menos humanas e menos merecedoras de respeito e consideração por sermos quem somos, e o pastor ou político que defender isso estará sendo homotransfóbico.
Não aceitamos ser acusados de articular uma conspiração para estabelecer uma “ditadura gay”, seja lá o que isso signifique, ou que tramamos contra a família brasileira. Quem disser isso não só é homotransfóbico, mas também é mau caráter. E é justamente dessas pessoas que queremos tratar aqui.
Queremos chamar a atenção para o fato de que falsos profetas têm usado o combate à comunidade LGBT como meio de autopromoção política e midiática. Agora, o pastor ou político que queira promover-se e conquistar poder político não tem que mostrar nenhum plano de governo, nenhuma proposta para mitigar as desigualdades sociais e as sérias deficiências que o país tem em termos de saúde, educação, segurança, moradia, meio-ambiente e desenvolvimento; basta atacar os LGBTs. Os cristãos de verdade têm que tomar cuidado com esses impostores.
O problema de alguns políticos evangélicos não é ser evangélico, mas é usar sua religião de forma oportunista para assumir posições de poder sem ter um compromisso real com o desenvolvimento do país. A tática é simples e é empregada principalmente por candidatos a deputado. O candidato vai a templos evangélicos, faz um discurso moralista, abordando uma agenda mínima: valorização da família, contrariedade ao aborto e oposição aos direitos LGBT. Pronto, ele não tem que assumir mais nenhum compromisso, ele nem tem que ser um bom político, basta defender essa agenda.
O resultado disso não poderia ser mais desastroso. Vários deputados evangélicos envolvidos com todo tipo de esquema de corrupção, processos, além de baixa frequência às sessões da Câmara ou das assembleias legislativas a que foram eleitos, e votações contra os interesses do povo brasileiro.
Para não dizer que estamos com mera maledicência, sugerimos que você mesmo, eleitor evangélico, avalie o deputado evangélico que recebeu o seu voto. Veja se ele votou contra o novo Código Florestal, que foi um verdadeiro golpe contra o ambientalismo, ou se ele participou ativamente da aprovação da PEC do trabalho escravo, que desapropria terras de pessoas que utilizam mão de obra em condições análogas à escravidão. Veja como ele votou em temas de interesse geral do país. Consulte sites como o “Transparência Brasil” e veja qual é o índice de faltas do seu deputado, se há processos contra ele por corrupção. Infelizmente, podemos garantir que, após uma consulta meticulosa, imparcial e honesta, na maioria das vezes, você não gostará do que irá descobrir.
É legítimo que um cristão queira ser representado por políticos cristãos, mas o que significa ter posições cristãs no seio da política atual? Como ter uma atuação cristã sem ferir a laicidade do Estado?
Primeiramente, o político evangélico, como qualquer outro político, deveria promover o bem comum e o bem estar de todos os cidadãos. Ter uma atuação cristã em um Estado laico é promover a paz e a justiça social, libertando as pessoas da fome, da miséria, promovendo saúde, educação, lazer, segurança, enfim, direitos humanos.
Os dogmas religiosos não podem interferir na atuação de um agente político, porque as leis e as políticas públicas são feitas para contemplar a todos, inclusive ateus e não cristãos. Aliás, o Estado Laico foi estabelecido, entre outras coisas, para garantir direitos da comunidade evangélica em um país de maioria católica. Imaginem se os casamentos entre evangélicos não fossem aceitos, ou se os templos evangélicos não pudessem ter uma fachada de igreja.
Absurdo? O Brasil já foi assim. Um evangélico poderia ser evangélico, desde que o templo evangélico não aparecesse, sendo os cultos em lugares reservados. Somente em 1861, após muito debate, é que os casamentos entre não católicos foram legalmente reconhecidos pelo Estado Brasileiro; entre católicos e não católicos, só mesmo em 1889 com a superação do Estado Católico pelo Estado Laico, com o advento da república.
Por outro lado, um agente político verdadeiramente cristão luta contra toda forma de preconceito e discriminação, afinal, como nos diz Jesus, devemos amar uns aos outros como ele nos ama, sem distinções de qualquer espécie. Nesse sentido, o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (CONIC) divulgou uma nota na qual defendia a aprovação do PLC 122/06, pouco antes de ele ser sepultado no Congresso, em dezembro de 2013.
Como diferenciar um pastor realmente comprometido com seu rebanho de um falso profeta?
Ir uma vez ou outra a um templo durante toda a campanha, tudo bem, mas desconfie do candidato que visita vários templos durante a campanha. Fazer política partidária no culto denota falta de respeito com o sagrado.
Cuidado com pastor que fica anunciando apoio a este ou àquele candidato, mesmo fora do templo. Um religioso que respeita o seu rebanho procura manter uma postura imparcial, pois há fiéis de todos os partidos e porque é muito difícil separar o religioso do cidadão. Na lógica do “Dai a César o que é de César”, uma Igreja séria tende a manter-se neutra.
E por fim, vote em candidatos, independente de religião, que tenham propostas para melhorar a vida das cidades, que não tenham histórico de processos por corrupção e que não lhe tentem comprar o voto. E depois de eleito, não deixe seu candidato em paz, cobre dele atuações na política mais abrangentes do que um simples veto à agenda LGBT.
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